Especialistas em saúde da África do Sul alertam sobre o risco e a inutilidade do compartilhamento de sangue para se drogar
Médicos especialistas na África do Sul emitiram alertas de saúde para aqueles envolvidos com "bluetoothing", prática que consiste em injetar o sangue extraído de alguém que tenha utilizado drogas, em uma tentativa inútil de compartilhar o “barato”.
"Bluetoothing", em homenagem a tecnologia pela qual dispositivos eletrônicos se conectam uns aos outros em curtas distâncias, ganhou notoriedade súbita na África do Sul este mês, após vários jornais disseminarem a prática.
Apesar da extensa cobertura da mídia sobre o "bluetoothing" na África do Sul, acredita-se que a prática não seja comum. Porém, informações errôneas a respeito dela podem estar, de fato, aumentando o número de casos.
Uma atividade semelhante – apelidada de "flash blood" – foi relatada no Quênia e na Tanzânia, na década passada.
"Bluetoothing" é supostamente associada ao uso de heroína ou whoonga. O conteúdo exato do whoonga – droga ilegal, inicialmente utilizada na África do Sul – é desconhecido. Mas pesquisas descobriram que geralmente a substância contém uma mistura de medicamentos antirretrovirais para tratamento do HIV e heroína.
Em uma entrevista para o The Times, jornal diário da África do Sul, um homem descreve como ele apela para o compartilhamento de sangue quando o seu suprimento de whoonga acaba.
"Quando eu não tenho nada e meu amigo tem uma dose, ele se injeta e depois eu injeto o sangue dele em mim mesmo, para compartilhar o barato," diz ele.
Apesar das pessoas afirmarem um certo "efeito" através do compartilhamento de sangue, os especialistas insistem que é uma prática inútil.
"Não há heroína suficiente no sangue extraído de outro usuário para se drogar," afirma Shaun Shelly, gestor da Diretoria de Política e Defesa de Direitos Humanos da associação TB/HIV Care (THCA).
"Qualquer reação observada é puro efeito placebo," ele acrescentou.
De acordo com Shelly, os casos de compartilhamento de sangue podem aumentar agora, pois os jornais têm amplamente divulgado a prática, sem informar que ela não causa, de fato, um "barato".
"Nossas equipes de projeto e colaboradores de apoio, que passam seis horas por dia com usuários que injetam drogas [na cidade] de Tshwane, ouviram um relato estranho sobre bluetooth, mas nunca viram isso acontecer... É importante que a mensagem de que o bluetooth não funciona seja espalhada, pois caso contrário, com toda a cobertura da mídia, [ela] vai se espalhar ".
Enquanto a possibilidade de prazer derivada do compartilhamento de sangue é mínima, na melhor das hipóteses, os riscos para a saúde são enormes.
Em um post do Facebook no início de fevereiro, o serviço nacional de doação de sangue da África do Sul advertiu que "a prática relatada de 'bluetooth'... apresenta risco duplo".
O risco da transmissão de um vírus pelo sangue – como o HIV – é "muito maior quando o sangue infectado de alguém é compartilhado diretamente na veia de outra pessoa".
Além deste risco entre os usuários que trocam seringas para drogas injetáveis, o compartilhamento de sangue também apresenta um perigo adicional – conforme aponta a declaração do post – uma vez que a "mistura de tipos de sangue incompatíveis pode ser fatal".
Autoridades sul-africanas continuam a criminalizar rigorosamente pessoas por crimes relacionados às drogas, mas isto só leva ao aumento do número de casos de "bluetoothing" – já que indivíduos com consumo problemático da droga recorrem a medidas mais desesperadas quando suas condições de vida pioram.
Ao contrário, para reduzir os casos de "bluetoothing", as autoridades terão mais êxito oferecendo educação, para conscientizar as pessoas de que é uma prática inútil e perigosa, e proporcionando serviços de redução de danos.
Atualmente existem serviços limitados de redução de danos para usuários de drogas injetáveis na África do Sul. O projeto Step Up da THCA fornece agulhas esterilizadas e outras ferramentas para ações de redução de danos. A THCA também estabeleceu uma parceria com a Universidade de Tecnologia de Durban para oferecer um programa de metadona voltado para o tratamento de indivíduos com padrão problemático de consumo de opiáceos.